quarta-feira, 27 de outubro de 2010

A última máscara

Enquanto as horas avançavam pela madrugada, respirei fundo na errônea esperança de conter o aperto que tão suave e letal esmagava meu peito em permanente surto. Assisti no silêncio dos mortos, ali diante da tua sombra noturna, sentada sobre o palco da minha vida, a última máscara relevante se despedaçar ao tocar o solo. Arrastada pela água da chuva sempre fria e vazia mergulhada na imensidão de suas gotas cristalinas em profunda solidão. Minha vista havia sido ofuscada pelas demasiadas luzes brilhantes desabando sobre mim, reluzindo velhas verdades nuas que se injetavam uma a uma em minha retina. Afiadas como facas. Duras como rochas. Destruindo o paraíso de papel construído em centenas de mentiras cretinas. Calada, permaneci sem nenhum movimento. Engolindo o tremor que estava moldando rachaduras em meus ossos e dissolvendo meu espírito, perdi o controle num soco sarcástico e honesto no concreto. Desejei desaparecer na fumaça dos falsos mundos. Tão tarde, tão escuro, perdi minhas pegadas no caminho quando desabei nas minhas próprias histórias. Desaprendi a andar e não é possível encontrar o rumo de volta. Labirinto. Tão tarde, o veneno já penetrou permanentemente nas finas veias que desenham minha alma. Tentei gritar teu nome, mas os tons estavam todos deslocados da harmonia, onde as vozes não conseguiam mais se encaixar, onde o silêncio calava a angústia de olhar um rosto estranho no reflexo da poça no chão. Olhos fixos em desespero. Eu poderia esperar com você a pessoa que já não sei mais distinguir entre os vultos? E no instante que o teu desejo percorrer meus devaneios, eu irei deitar na tua cama. E quando teu sangue pulsar, percorrendo teu corpo, transformando um leve sorriso de tédio em teu rosto, eu irei sorrir de volta e desejar desaparecer na fumaça de tuas palavras..

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Teu mais belo pesadelo

O que mais é preciso pra você?
Olhos sem visão. Corpo. Prazer.
O que mais é preciso pra você?
Gritos. Gemidos. Fogo sem crer.
O que mais é preciso pra você?
Enlouquecer. Entorpecer. Atirar-se na escuridão.
O que mais é preciso pra você?
Poucas palavras. Centenas de horas. Solidão.
O que mais é preciso pra você?
Apenas gosto. Apenas ópio. Apenas ilusão.
O que mais é preciso pra você?
Sente o que sente. Mente não sentir. Finge.
O que mais é preciso pra você?
Tempestade no dia. Noites aflitas. Suspiro da dor.
O que mais é preciso pra você?
Um lar. Um par. Um milhão de segredos. Dormir.
O que mais é preciso pra você?
Respirar fundo e sorrir para conter a lágrima que grita em ti.
Acreditar naquilo que é vida, naquilo que é dia dentro dos vestígios do fim.
Incendiando o mundo com tuas fantasias, tuas mentiras e jogos de xadrez.
Com a alma tão bem escondida sob a face de lama dos contos errôneos da tua vida.
Sente-se mais um instante. São apenas horas. São apenas dias. São apenas teus sofrimentos.
E beba mais um gole, sinta o latejar da ardência. O fogo em minha pele de gelo.
Eu serei tua sina, teu temor, tua calmaria, teu mais belo pesadelo. .

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Colisão

Não mais que de repente. Em alguma fração do tempo. Descubro em mim pensamentos indecifráveis, pesadelos inefáveis. Frases inteiras nuas, ocultas, sem palavras. Mudas. Eu. Embriagada na distorção da raiva. Tenho a visão escurecida e engasgada. Destruída por falácias despedaçadas. Engolindo o último grito contido dentro da alma. Em silêncio, suportando a doce tortura fria das memórias empoeiradas. Mergulhei tão fundo na busca desenfreada de respostas. Tantas vezes me perdi. Em vão. Não mais corri. Parei de súbito. Num susto. Num espasmo. No desespero, paralisei meus passos. Contive o fôlego. Desejei fechar os olhos exaustos. Os ponteiros se quebraram aos socos, congelados. As vozes de agonia interna se calaram. Cada ruído que atormentava os tímpanos desaparecia aos poucos, perdido no vazio do espaço. Apenas na pele ardia um leve, real, sincero toque. Eu vi no reflexo dos teus olhos o rumo de volta do inferno. Eu vi você acreditar em mim. E da lágrima aflita que corria em meu peito se fez valer um triste sorriso. Por um instante inconsciente, eu confiei em ti. E da hipocrisia, lenta nascia uma verdade quebrando o asfalto entre o caos dos espíritos. Persigo teus rascunhos insensatos, incorretos, vagos em meus próprios devaneios. Deito e em pensamentos tortos, rabisco versos sobre sentimentos tão incertos ainda não catalogados. Meus sonhos caem assim como aves sangrando, no céu, nuvens ao meio. Gostaria de te sorrir de volta, mas desaprendi como utilizar a alegria. Toda minha vida a nossa frente num rumo sem freios. Tenho me procurado em cidades abandonadas e em alguma dose pura de nostalgia. Mas, ao fim do dia, colocarei uma emoção no rosto e desafiarei tuas inúmeras faces. Sem saber teu nome, tocarei em teu sonho, teu gosto, teu som, tuas formas abstratas. Dúvidas nas perguntas. Rimas entre os dedos. Dança dos silêncios. Partilha de velhos segredos. Ilusões sobre teus pés. Corações atirados em papéis. Insônia nas minha noites longas. Tua luz em minhas manhãs cinzas. E além, iluminando as ruas da madrugada vazia. Na colisão repentina das nossas vidas.Te espero...

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Sonho vazio

Eu desejaria apenas a chance de conseguir chegar ao teu alcance.
Olhar profundamente dentro dos teus olhos por um breve eterno instante.
Assistir cada segredo teu despencando em verdades a minha frente.
Mergulhar neste silêncio com fôlego para alcançar a essência da tua alma.
Encontrar o que há em mim para acompanhar teus passos até aqui.
Transmitir com o vento meu pensamento para que te absorva na minha calma.
Quebrar em pequenos pedaços o tempo congelado que me arrastou na solidão.
Onde os dias mais pareciam séculos em que sufoquei meus profundos sentimentos.
Simplesmente a te esperar..
Tocar tua pele, permitindo o fogo se alastrar em meus olhos e ao nosso redor.
Queimando nas cinzas de um desejo adormecido.
Aproximar teu corpo do meu com um gesto desesperado e simples como sorrir.
Flutuar alto na paz suave que paira devagar e tão leve como se a rotação do planeta tivesse esperado tranquila pelo nosso compasso.
Ouvir teu coração pulsando e logo minha angústia evaporar acima de nós.
Respirando pela primeira vez a liberdade de te amar sem temer os fantasmas sombrios.
Acordo sem lágrimas para chorar...
O sonho teve apenas o seu começo.
Assisti a chuva de penas negras em meu jardim durante toda a manhã.
Da janela, observei o mundo escurecer, triste.
Permaneci na cama nesse dia morto.
Perdida em meus próprios devaneios.
Com o medo pairando pesado no ar.
De olhos abertos, ouvi a resposta fria, gritada em meus ouvidos.
Estive completamente sozinha.. Em um sonho vazio..

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Fuga..

Pra onde fugiu o vento tão doce que tocava minha pele fria e suspirava na minha alma?
Pra onde fugiu a leveza dos segundos que desfilavam sorrindo em harmonia à minha volta?
Pra onde fugiu a essência da solidão tão viva que preenchia o meu peito com palavras?
Pra onde fugiu o céu repleto de sonhos enferrujados, carregados de velhas lágrimas?
Pra onde fugiu a dança das frases profundas que foram soltas em melodias inventadas?
Pra onde fugiu a vela acesa em meus olhos dentro de uma fuga imaginada?
Pra onde fugiu meus caminhos errantes, meus sorrisos de plásticos, minhas profanas lástimas?
Alguém saberia me dizer em qual estradas distante foi que deixei minha máscara?