quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Ela, lado oposto de espelho quebrado


Ela é quase mistério indefinido de sujeito oculto entre pensamentos indeterminados, sonho indecifrável, rio subterrâneo, lado oposto de espelho quebrado.
      Ela quase abre aqueles olhos brilhantes pela manhã ao acordar como em tantas outras manhãs de primavera com os raios invadindo as frestas da janela que já pensou em consertar. Estica os braços como quem implora um abraço ao ar gelado que inspira profundamente, vindo da grama úmida do quintal lá fora. Nada em especial, mas ela não se deixa enganar pelo som dos pássaros, nem pela cidade, nem pelas cores e nem pelas vozes. Ela quase sorri meio torto, meio impreciso, meio livre entre os outros tantos que insistem a circular pelas calçadas moldados, rotulados, acorrentados ao passar das horas, sem notar o tempo correndo solto em disparado ao lado e a vida indo embora para se atirar em outras direções, outras ilusões, outras dimensões. Ela quase sente pena deles, mas está submersa profundo demais em meio aos pensamentos inesperados que inundaram seus sonhos na última noite, desconstruindo partes de seu mundo inacabado e secreto. Ela quase estica a mão para alcançar as respostas que flutuam como folhas secas dançando na sua frente, mas distanciam-se teimosas ao tentar toca-las. Acaba por contentar-se em observar a coreografia de cada uma subindo pelas nuvens densas e claras que vão se arrastando pelo céu. De repente, ela quase permite as palavras tão guardadas escorrerem de sua boca enquanto procura rapidamente na memória algum assunto banal capaz de quebrar a tortura do silêncio que monta rápido um imenso muro de pedras entre nós, mas essas ainda não, ela pensa, quase soltas, ela puxa de volta num golpe imaginário certeiro para o canto escuro do pensamento e só se entrega num relance em segundos de olhar que ao encontrar meus olhos se dissipa num espaço perdido do tempo. Ela quase voa em madrugadas abafadas, onde o quarto fica coberto de versos que atiro sem que saiba, mas insiste em não querer decifrar e apenas nadar entre seus mares desconcertantes de ilusões. Meu bem, deixa estar, já é quase de manhã outra vez e sei bem que irá esconder lá no fundo do peito, onde se aperta aquele desejo incansável de esperar que as coisas logo cheguem, logo melhorem, logo mudem, logo passem..

sábado, 5 de novembro de 2011

No labirinto desse pesado viver de todos nós


Que pesado esse viver sobre cinzas, cortes, penas, pétalas despedaçadas, rasgos, vírgulas de frases intermináveis. Parece não caber mais em mim esse conto sem final. Neste labirinto de questões mal-resolvidas, infinitas, esquecidas, não estamos sozinhos. Não é apenas nós procurando em últimos vestígios o que restou de nossa identidade. Ainda ouço a harmonia sonora das tuas palavras, mas não consigo mais decodificar seus segredos quase indistintos. Escute quando eu falar que minha vida contida não era vida de verdade até o encontrar da tua vida vazia naquele lugar. E dos teus sonhos fiz meus sonhos e dezenas de outros planos que assisto agora em pedaços se desfazer sobre as águas calmas de o misterioso pensar. Lá, onde o brilho intenso do teu olhar queima ainda minhas lágrimas pelo fogo refletido da tua alma. Se hoje eu cair na tua frente e não conseguir levantar, leve pra longe daqui todas as nossas memórias. Pois não há luz aqui no fundo dos meus dias mais inacabáveis e chuvosos. A parte que não encontro mais de mim ainda existe em você? Tento encontrar abrigo seguro dentro da solidão, mas algo continua morrendo aqui dentro cada vez que me sinto assim. Mais algumas horas e não me chame amanhã pela manhã, estou perdida dentro desse labirinto do pesado viver de todos nós. Esse drama de constante sofrer vem adoecendo a vida que ainda resta pra nós e nunca parece o bastante para ir embora. Você não precisa de mim como eu preciso. Não quer o que eu quero. Não enxerga as coisas que eu vejo e me assustam. Aquele meio de mim que corta e aquele que é cortado, lavando o chão da consciência de sonhos perdidos e despedaçados.